LUSÍADAS: ANÁLISE DA PROPOSIÇÃO




Análise da Proposição – Os Lusíadas (I, 1-3)

A finalidade da proposição, em qualquer epopeia, é a enunciação do assunto que o poeta se propõe tratar.

Assim é, também, n’ Os Lusíadas: Camões está decidido a tornar conhecido em todo o mundo o valor do povo português (“o peito ilustre lusitano”).

E para isso estrutura a sua proposição em duas partes: nas duas estâncias iniciais, enuncia os heróis que vai cantar; na segunda parte, constituída pela terceira estrofe, estabelece um confronto entre os portugueses e os grandes heróis da Antiguidade, afirmando a superioridade dos primeiros sobre os segundos.

Que o herói desta epopeia é coletivo, é um facto incontestável.

Quanto a isso, o próprio título é inequívoco: os “Lusíadas” são, afinal, os portugueses — todos, não apenas os passados, mas até os presentes e futuros, na medida em que assumam as virtudes que caracterizam.

O facto de o seu herói ser coletivo e a sua ação se estender por um intervalo de tempo muito vasto permite-lhe desdobrá-lo em subgrupos, conforme verificaremos a seguir. O plural utilizado para designar cada um deles confirma o carácter coletivo do herói: “barões assinalados”, “Reis”, “aqueles”.

A inversão da ordem sintática nessa primeira frase, que engloba as duas estâncias iniciais, pode tornar difícil, à primeira leitura, a compreensão do texto. A ordem normal seria esta: Cantando, espalharei por toda a parte as armas e os barões…

Pode esquematizar-se o conteúdo dessas duas estrofes da seguinte maneira:

Pelo esquema, vemos que Camões apresenta três grupos de agentes (“agentes” e não heróis, porque herói é “o peito ilustre lusitano”).

O primeiro é constituído pelos “barões assinalados”, responsáveis pela criação do império português na Ásia. É evidente que o poeta destaca principalmente a actividade marítima, a gesta dos descobrimentos (“Por mares nunca dantes navegados, / Passaram ainda além da Taprobana”.

O segundo grupo inclui os reis que contribuíram diretamente para a expansão do cristianismo e do império português (“foram dilatando / A Fé o Império”). Aqui é sobretudo o esforço militar que se evidencia (“andaram devastando”).

No terceiro grupo incluem-se todos os demais, todos os que se tornaram dignos de admiração pelos seus feitos, quaisquer que eles sejam.

A enumeração é apresentada em gradação descendente: em primeiro lugar, os envolvidos na expansão marítima; depois, os reis envolvidos na expansão militar; finalmente, todos os outros. Essa valorização relativa é confirmada pelo espaço textual: oito versos, para o primeiro grupo; quatro, para o segundo; dois apenas, para o terceiro.

No entanto, este terceiro aparece como um grupo aberto: nele incluem-se não apenas heróis passados, mas todos aqueles que se venham a evidenciar no futuro. Note-se que, para os dois primeiros grupos, o poeta utiliza o pretérito perfeito, enquanto aqui recorre ao presente perifrástico —“vão”².

Ao contrário das epopeias primitivas, aqui o herói é coletivo, o que o próprio título logo indica — Os Lusíadas. Por outro lado, na proposição, como vimos, a indicação dos heróis, além de ser desdobrada em grupos diferenciados, em cada um deles é utilizado o plural.

A proposição não é uma simples indicação dos seus heróis, mas obedece já a uma estratégia de engrandecimento dos portugueses.

A expressão “por mares nunca dantes navegados” evidencia o carácter inédito das navegações portuguesas; observe-se o destaque dado à palavra “nunca”.

A exaltação continua com a referência ao esforço desenvolvido, considerado sobre-humano (“esforçados/ Mais do que prometia a força humana”).

Na segunda parte, esse esforço de engrandecimento continua, desta vez através de um paralelo com os grandes heróis da Antiguidade. O confronto é estabelecido com marinheiros famosos (Ulisses e Eneias), eles próprios heróis de duas epopeias clássicas, e conquistadores ilustres (os imperadores Alexandre Magno e Trajano).

A escolha de navegadores e guerreiros não é inocente, visto que é exatamente nessas duas áreas que os portugueses se destacam.

E para concluir, uma nota final, na mesma linha: “… eu canto o peito ilustre lusitano, / A quem Neptuno e Marte obedeceram”. A submissão do deus do mar e do deus da guerra aos portugueses (“o peito ilustre lusitano”) é uma
forma concisa e muito expressiva de exaltar o valor do seu herói.

Fichas para exercitar:

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